Por Nicholas Shores e Paulo Roberto Netto
São Paulo, 13/04/2021 - A comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criada para avaliar a gestão federal no combate à pandemia propôs a inclusão das mortes e lesões corporais causadas, segundo os juristas, por omissão do Planalto no rol de crimes que teriam sido cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro na notícia-crime apresentada pela entidade à Procuradoria-Geral da República, no mês passado. É o que mostra uma minuta da proposta de aditamento obtida pelo Broadcast Político.
O colegiado presidido pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto e composto por nove juristas renomados no País concluiu nesta terça-feira (13) que Bolsonaro cometeu crimes contra a responsabilidade e contra a humanidade durante a crise de covid-19 e deve ser responsabilizado nacional e internacionalmente pelos óbitos causados pela doença.
A proposta de aditamento foi enviada ao presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que assinou a notícia-crime contra Bolsonaro em março. O pedido de investigação focou em quatro crimes supostamente cometidos pelo presidente: prevaricação, emprego irregular de verba pública, expor pessoas a risco de vida e infração de medida sanitária. Para a comissão da Ordem, o presidente também deve responder pelas mortes causadas por negligência do governo federal.
"Não há outra conclusão possível: houvesse o Presidente respeitado aquelas medidas sanitárias preventivas contidas no art. 3º, incisos I, II e III, alínea d, da Lei 13.979/20, seguramente milhares de vidas teriam sido preservadas. Deve, por isso mesmo, responder não somente pelo delito de infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do Código Penal), como também pelas mortes e lesões corporais de natureza grave daí decorrentes por negligência (art. 285 do Código Penal)", propôs o colegiado de juristas.
Segundo a comissão, Bolsonaro empreendeu uma “cruzada” contra medidas que contribuiriam para a redução do número de casos e óbitos por covid-19, sendo a principal delas a resistência à compra de vacinas contra a doença. Os juristas relembram que o presidente demonstrou falta de interesse em adquirir o imunizante da Pfizer no ano passado e desautorizou o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello a negociar doses da Coronavac com o Instituto Butantan.
"É preciso observa que o presidente da República, ao empreender durante meses um amplo movimento antivacina, não somente violou de forma intencional o art. 3º, inciso III, alínea d, da Lei 13.979/2020, incorrendo, portanto, no delito de infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do CP), como também, em razão disso, produziu numerosas mortes e lesões corporais de natureza grave por negligência (art. 285 do CP)", apontam os juristas.
O colegiado diz ser "verdadeiramente incompreensível" o fato de Bolsonaro não ter manifestado pronto interesse pela vacina da Pfizer e que, embora tenha autorizado posteriormente a compra da Coronavac, a política "deliberadamente postergatória"' do Planalto gerou atraso na imunização da população e produziu 'consequências dramáticas'.
O pedido de aditamento foi enviado a Santa Cruz logo após a comissão concluir que "fundadas e sobradas razões" para Bolsonaro responder nacional e internacionalmente pela gestão do governo federal na pandemia, seja por meio de processo de impeachment ou por denúncia ao Tribunal Penal Internacional. Segundo os juristas, o presidente instaurou uma "República da Morte" ao agir contra medidas de proteção ao coronavírus e se omitir em diversas situações que poderiam reduzir o número de óbitos causados pela doença.
“Não há outra conclusão possível: houvesse o presidente cumprido com o seu dever constitucional de proteção da saúde pública, seguramente milhares de vidas teriam sido preservadas. Deve, por isso mesmo, responder por tais mortes, em omissão imprópria, a título de homicídio. Deve também, evidentemente, responder, em omissão imprópria, pela lesão corporal de um número ainda indeterminado de pessoas que não teriam sido atingidas caso medidas eficazes de combate à Covid-19 tivessem sido implementadas. Por óbvio, para fins de responsabilização criminal, esse número deve ser apurado”, anotou o relatório.
O relatório da comissão será levado para discussão no plenário do Conselho Federal da OAB, que reúne representantes das seccionais estaduais da entidade e o seu presidente, Felipe Santa Cruz. Com base no parecer, a Ordem poderá apresentar um pedido de impeachment contra Bolsonaro. Até o momento, a OAB não elaborou nenhum pedido de afastamento do presidente
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