Por Daniel Weterman
Brasília, 27/04/2021 - Escolhido para relatar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) é o parlamentar que mais vota contra o governo no Senado entre todos integrantes da comissão, inclusive os de oposição, conforme levantamento da Inteligov exclusivo ao
Broadcast Político.
O perfil reforça o posicionamento crítico do parlamentar em relação ao presidente Jair Bolsonaro na investigação. O relator, porém, também está distante dos demais integrantes da CPI nas votações do plenário. Para a Inteligov, os dados indicam um cenário de divisão na comissão, apesar de o governo ter minoria.
Renan tem feito duras críticas à postura de Bolsonaro na crise, o que indica uma tendência de colocar o presidente da República no alvo da CPI. Durante a sessão de instalação da comissão, o senador do MDB afirmou que o governo federal está "politizando" a investigação e prometeu identificar e punir os responsáveis pelas mortes do novo coronavírus no País. Apesar de o parlamentar reforçar que terá uma postura isenta, o discurso foi criticado abertamente por governistas, que acusaram Renan de antecipar um julgamento sem provas.
Desde o início desta legislatura e, portanto, desde o começo do governo Jair Bolsonaro, Renan só seguiu a orientação do governo em 55,85% das votações no plenário do Senado. O levantamento da Inteligov compara o voto dos senadores com o posicionamento do líder do governo na Casa em cada votação entre fevereiro de 2019 e 27 de abril deste ano, quando a CPI foi instalada.
O índice de Renan é baixo na comparação os demais senadores. Isso porque, diferentemente da Câmara, o Senado conduz uma pauta com mais concordância entre os diferentes partidos. A maioria dos parlamentares, por exemplo, vota com o governo em mais de 80% das vezes.
Mas não é apenas em relação ao governo que o relator tem posicionamentos diferentes. Entre os integrantes da CPI, Renan chega no máximo a uma identidade de 73,6% - nesse caso, com Ciro Nogueira (PP-PI), aliado do presidente Jair Bolsonaro na comissão. Na prática, os números indicam que o posicionamento de Renan Calheiros deve enfrentar divisões.
"Em um tema como esse, que é de grande relevância, mínimas diferenças entre os integrantes podem trazer divergências na apresentação do relatório, por exemplo", afirmou a diretora de Comunicação e Políticas Públicas da Inteligov, Raquel Almeida, ao
Broadcast Político.
É no relatório que Renan vai indicar as conclusões da CPI, apontar responsáveis pela pandemia, identificar desvios e poderá até encaminhar o indiciamento de autoridades. Esses encaminhamentos podem ser usados, por exemplo, em uma ação judicial contra ex-ministros ou mesmo servir de base para um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro.
No primeiro discurso como relator, o senador do MDB prometeu que o parecer será construído de forma conjunta, considerando a maioria da comissão, e não apenas sua opinião particular. "O relator tem um desalinhamento maior com o líder do governo e está aliado de maneira mais forte aos partidos de oposição. Isso dá ideia de como vai a movimentação dele como relator. Ele vai ter um papel fundamental, é uma peça chave na CPI", afirmou a diretora do Inteligov.
Os membros da CPI da Covid e a identidade com o governo |
|
Nome |
Partido |
Estado |
Status na CPI |
Grupo |
Identidade com o governo |
Tasso Jereissati |
PSDB |
CE |
Titular |
Independente |
92,86% |
Zequinha Marinho |
PSC |
PA |
Suplente |
Governo |
91,91% |
Luis Carlos Heinze |
PP |
RS |
Suplente |
Governo |
91,72% |
Jorginho Mello |
PL |
SC |
Titular |
Governo |
88,28% |
Ciro Nogueira |
PP |
PI |
Titular |
Governo |
88,03% |
Marcos Do Val |
PODE |
ES |
Suplente |
Governo |
86,76% |
Eduardo Braga |
MDB |
AM |
Titular |
Independente |
86,47% |
Eduardo Girão |
PODE |
CE |
Titular |
Governo |
84,93% |
Marcos Rogério |
DEM |
RO |
Titular |
Governo |
83,82% |
Angelo Coronel |
PSD |
BA |
Suplente |
Independente |
81,34% |
Alessandro Vieira |
CIDADANIA |
SE |
Suplente |
Oposição |
80,14% |
Omar Aziz |
PSD |
AM |
Titular |
Independente |
80,00% |
Otto Alencar |
PSD |
BA |
Titular |
Independente |
78,42% |
Jader Barbalho |
MDB |
PA |
Suplente |
Independente |
75,53% |
Rogério Carvalho |
PT |
SE |
Suplente |
Oposição |
70,07% |
Humberto Costa |
PT |
PE |
Titular |
Oposição |
68,75% |
Randolfe Rodrigues |
REDE |
AP |
Titular |
Oposição |
66,43% |
Renan Calheiros |
MDB |
AL |
Titular |
Independente |
55,86% |
|
Fonte: Inteligov
Dos 11 titulares da CPI, Bolsonaro conseguiu montar uma tropa de choque com apenas quatro senadores. A oposição tem dois integrantes. O grupo de cinco senadores independentes é considerado o fiel da balança nessa distribuição. Por enquanto, essa ala tem sido crítica à postura de Bolsonaro na pandemia, formando com os oposicionistas o chamado G-7. O Palácio do Planalto, porém, nutre nos bastidores uma expectativa de influenciar o voto de alguns senadores durante o funcionamento da CPI.
Para isso, Ciro Nogueira tem procurado estabelecer uma ponte amigável com o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), e com o relator. Nogueira votou em Omar para o comando do colegiado, contrariando os demais votos de governistas, que foram para Eduardo Girão (Pode-CE).
Além disso, elogiou publicamente o senador Renan Calheiros, apesar de ter tentando tirá-lo anteriormente da função. O presidente do Progressistas não assinou a ação no Supremo Tribunal Federal protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF) por três integrantes da base governista contra Renan na relatoria, em mais um aceno para o parlamentar que conduzirá as investigações da CPI.
No caso dos independentes, os rumos da CPI serão determinados conforme o alinhamento desses senadores com os governadores das respectivas bases eleitorais, diz a analista. Além da conduta do governo federal, a CPI foi criada para investigar o repasse de verbas para Estados e municípios.
Renan e Jader Barbalho (MDB-PA), por exemplo, são pais dos governadores de Alagoas e Pará, respectivamente. Eduardo Braga (MDB-AM), por sua vez, faz oposição ao governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC). O Sudeste só tem um representante, que ainda é suplente. O Centro-Oeste não tem nenhum integrante na CPI. "O Estado é que vai alinhar o posicionamento no caso dos independentes", disse Raquel Almeida.
Fidelidade
Na outra ponta do levantamento, estão os parlamentares mais fiéis ao governo nas votações. O integrante da CPI mais próximo ao Executivo desde 2019 é o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), com 92,86% de votos em comum com a liderança do governo. O tucano é crítico a Bolsonaro, mas tem uma forte identidade com a pauta econômica do governo.
Ele foi, por exemplo, o relator da reforma da Previdência e do novo marco legal do saneamento básico, dois projetos patrocinados pela equipe do Ministério da Economia. Na sequência, aparecem escudeiros de Bolsonaro na CPI: Zequinha Marinho (91,91%), Luiz Carlos Heinze (91,72%), Jorginho Mello (88,28%) e Ciro Nogueira (88,03%).
Contato: daniel.weterman@estadao.com
Para saber mais sobre o Broadcast Político, entre em contato com comercial.ae@estadao.com