Por Idiana Tomazelli e Daniel Weterman
Brasília, 22/10/2019 - O risco de a reforma da Previdência ser desidratada em mais R$ 76,5 bilhões acabou minguando as comemorações pela aprovação do texto-base da proposta no plenário do Senado Federal. Após a proclamação do placar do segundo turno, de 60 votos a 19, melhor até do que no primeiro turno, não houve aplausos nem gritos. O silêncio de tensão sobre as votações que viriam a seguir acabou pesando mais que a empolgação pelo resultado principal.
A apreensão se justificou logo em seguida: na hora de votar um destaque do PT que pode alterar o conteúdo da proposta, o plenário do Senado empacou.
A bancada petista quer tirar do texto a vedação de aposentadoria especial por periculosidade, com o objetivo de contemplar vigilantes armados com regras mais benevolentes para acessar o benefício. O governo, porém, alega que retirar a proibição abre brechas para que outras categorias peçam uma aposentadoria especial. O tamanho do rombo seria de R$ 23,2 bilhões em dez anos.
Em uma negociação cheia de espectadores no café contíguo ao plenário do Senado, ainda durante a tarde desta terça (22), a equipe econômica tentou convencer o senador Paulo Paim (PT-RS), principal defensor do destaque, a negociar um acordo. O governo proporia uma lei complementar para contemplar vigilantes armados em troca da retirada do destaque. Por trás da tentativa estava o reconhecimento de que Paim estava conseguindo angariar apoiadores a sua proposta. Mas não houve acerto.
Já no plenário, uma nova confusão acabou levando mais senadores a pender para o lado favorável ao destaque petista. Técnicos do Senado informaram que hoje a aposentadoria por periculosidade seria permitida na Constituição, e o direito seria suprimido na proposta do governo.
Líder do MDB, maior bancada do Senado, Eduardo Braga (AM) engrossou o coro dos que defendiam a aprovação do destaque, com a retirada da vedação a aposentadorias por periculosidade. Com risco crescente de o governo sofrer nova derrota, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), cancelou a votação e convocou sessão para amanhã (23), dando tempo ao governo para tentar costurar uma solução.
Na saída do plenário, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, negou que a proposta do governo prejudique trabalhadores expostos à periculosidade. Segundo ele, o objetivo é deixar claro o critério e evitar interpretações dúbias na Justiça. Além disso, Marinho lembrou que aposentadorias por categoria são proibidas desde 1995. O governo alega ainda que periculosidade é um benefício trabalhista e nunca foi critério para aposentadoria.
O secretário admitiu, porém, o temor em relação à votação. “Talvez fosse arriscado votar hoje. Vamos aguardar”, afirmou.
Marinho está neste momento reunido com o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE) e técnicos do governo em busca de uma solução.
Bezerra, por sua vez, disse que continuará trabalhando agora à noite e marcou um encontro com Paim amanhã 8h30, antes da sessão (marcada para 9h) que continuará a votação dos destaques da reforma da Previdência. “Esperamos que daqui até amanhã tenhamos argumentos para o plenário decidir”, disse.
Além do destaque do PT, há ainda outra mudança pendente de votação. A bancada da Rede quer excluir da reforma a exigência de idade mínima para aposentadoria de trabalhadores expostos a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde. A retirada do dispositivo desidrataria a proposta em R$ 53,3 bilhões em dez anos.
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